Segmento popular registrou alta de 18,3% nas vendas de imóveis, de janeiro a julho deste anoFreepik

Rio - À medida que 2023 se aproxima do fim, o mercado imobiliário carioca apresenta transformações notáveis, especialmente no setor de aluguéis. A recuperação do turismo e a movimentação para as festas de fim de ano impulsionam os bairros do Rio a se prepararem para receber uma variedade de visitantes e moradores temporários. Esse panorama tem chamado a atenção de corretores e inquilinos pela dificuldade em alugar um imóvel residencial na cidade, principalmente na Zona Sul, onde estão bairros historicamente conhecidos pelo apelo turístico.
A corretora de vendas Juliana Rosa de Moraes, 30 anos, moradora de Botafogo, procura um apartamento maior no mesmo bairro, desde que passou a acomodar os dois enteados na mesma residência. Segundo ela, após o meio do ano houve uma elevação nos preços, e sobram poucas opções acessíveis.
"Já procurei umas cinco imobiliárias, e não acho nada que caiba no meu orçamento. Quero continuar no mesmo bairro mas, tanto aqui, quanto o (bairro do) Flamengo e Leme estão surreais de caro. Fiz uma proposta para um proprietário mas, se ele não aceitar, vou esperar até março para pesquisar de novo", disse.
De acordo com Juliana, a procura por aluguéis de temporada também afeta a oferta de unidades. "Muitos proprietários que estão com imóveis vazios porque preferem alugar para o fim de ano na cidade. Então fica inviável conseguir um apartamento na Zona Sul", concluiu. 
Para o economista Ricardo Maluf, essa alta busca por aluguéis tem uma explicação: a estagnação nas vendas de imóveis. As altas taxas de juros, que impactam diretamente nos contratos de financiamentos de imóveis, seriam um fator primordial para as famílias não realizarem o 'sonho da casa própria'. "Apesar de estar em leve queda, os altos índices de taxas, como a Selic, forçam o adiamento da decisão de compra pelos consumidores porque os custos de créditos bancários estão bastante elevados", explicou.

Maluf acrescentou que os consumidores que dispõem de dinheiro preferem aproveitar os juros altos para aplicar em títulos de renda fixa e aproveitar os rendimentos. "O aluguel hoje está depreciado, antigamente era praxe do mercado estabelecer o preço de locação correspondente a 1% do valor do imóvel. Se ele custava R$ 300.000, seria R$ 3 mil. Hoje em dia, vemos propriedades de aproximadamente R$ 600 mil sendo alugados por R$ 2.500. Isso favorece a quem deseja uma boa moradia por um preço acessível", acrescentou.
 
O supervisor comercial Rodrigo Brum, 46 anos, é um dos que preferem aplicar o dinheiro. "A maior questão é que, mesmo os investimentos de renda fixa, como CDB, valem mais a pena do que aportar na compra do imóvel simples. Por exemplo, com um investimento de R$ 500 mil, a média de rendimento é de R$ 5 mil. Dá pra pagar o aluguel, e ainda sobra um fluxo financeiro para usar em outros negócios", disse.
 
De acordo com dados da Secovi Rio - entidade que representa imobiliárias, condomínios e administradores na cidade do Rio de Janeiro - em setembro de 2023, o valor médio do m² para locação residencial foi de R$ 40,15, mostrando uma estabilidade no mercado neste ano. Em comparação com o mesmo período em 2022, quando o valor era de R$ 31,06, houve uma valorização de 30%.
 
Maurício Eiras, estatístico da instituição, afirma que a falta de unidades é a grande responsável: "Toda essa valorização se reflete na lei da oferta e demanda. Se tem muita gente querendo o aluguel, eu vou valorizar o meu imóvel. Já na compra e venda, os dados apontam um m² estável ou até mesmo com uma pequena queda. As pessoas estão receosas e preferindo esperar para ver como vai ficar a economia e a taxa de juros antes da decisão da compra", concluiu.
 
Leblon e Ipanema na ponta da valorização; Centro e Tijuca vem em seguida
 
Com o cenário de compra e venda estagnada e a alta procura pela locação acaba trazendo um outro impacto: a valorização de pontos tradicionais, ressurgimento de locais antes desvalorizados e surgimento de novos polos de moradia. Tradicionalmente, destinos como Copacabana, Ipanema e Leblon sempre foram os mais procurados para alugueis no fim do ano. Entretanto, este ano destaca-se pelo crescente interesse em bairros centrais do Rio de Janeiro.
 
Segundo boletim da Secovi-RJ, Ipanema e Leblon são os bairros com maior valorização entre 2022 e 2023, com o m² superando 50% de aumento. Enquanto isso, a Região Central teve uma variação mais sutil, porém significante passando de R$ 26,31 para R$ 31,10, um acréscimo de 18,2%. Já na Zona Norte, o aumento foi de de R$ 18,97 para R$ 20,30, incremento de 7,01%.
  
Contratos por temporada também estão em alta
 
A dificuldade na busca por aluguéis também afetam quem vem passar as festas de fim de ano na cidade maravilhosa. Com a alta de valores nos bairros turísticos, o Centro e a Zona Portuária iniciam um renascimento, com diárias variando de R$ 150 a R$ 300, enquanto áreas tradicionais da Zona Sul, como Copacabana e Ipanema, têm preços oscilando entre R$ 400 e R$ 700 para propriedades similares.
 
A Barra da Tijuca, que recentemente tem contado com grande oferta de empreendimentos, tem sido uma opção de custo mediano com opção de lazer e proximidade à praia. Em aplicativos de aluguel por temporada é possível encontrar, na média, unidades para uma pessoa com valores entre entre R$ 300 e R$ 500, a diária. 
 
O DJ Carlos Eduardo, 35 anos, mora no Pará e vem passar as festas de fim de ano no Rio. Como pretende passar a virada em Copacabana, procurou algum lugar próximo ao bairro. Após muita pesquisa na internet, conseguiu uma quitinete no Catete por meio de um aplicativo.
 
"Não é a primeira vez que venho para cá. Dessa vez, queria ficar mais perto da praia de Copacabana, mas, devido aos preços altos, acabei optando pelo Catete. Não fica tão caro e dá para ir de metrô, pelo menos", pontuou.
 
'Carteira praticamente zerada'

A tendência de aumento nos contratos de locação tem sido sentida nas ruas. Apesar de elevação nos preços, os profissionais do setor comemoram a boa fase. Segundo Darlan Carlos de Souza, diretor do Conselho de Corretores de Imóveis do Rio (Creci-RJ), a carteira de imóveis 'está zerada': "Minha área de atuação é Zona Sul, Centro, Tijuca e grande Tijuca, e aluguei muito o ano inteiro. Só este ano, já concretizei mais de 30 locações e estou sem nenhuma unidade para atender. O mercado hoje enfrenta uma escassez de mercadoria incrível pois a demanda está muito superior à oferta. Estou com uma carteira para aluguéis praticamente zerada".

Enquanto o mercado celebra o fechamento de negócios, quem deseja trocar de endereço anda passando maus bocados. É o caso da pensionista Flavia Silva, de 51 anos e moradora do Andaraí. Após voltar à cidade natal, depois de residir por três anos no Distrito Federal, alugou provisoriamente um apartamento no bairro, mas desde o meio do ano tenta morar na Tijuca e não consegue uma unidade.

"Já fui em mais de dez imobiliárias e até agora não achei um imóvel decente. Os que apareceram estavam muito depreciados, ou com valor muito alto. Tenho encontrado apartamentos por R$ 2 mil, com um ou dois quartos, e em condições péssimas," disse.

A pensionista não acredita que vá conseguir se mudar até o fim do ano. "A demanda está alta e as imobiliárias 'sapateiam' na cara da gente. Tá difícil!", desabafou.
Leonardo Schneider, vice-presidente do Secovi Rio, tem uma visão mais otimista para o próximo ano. De acordo com o diretor, a tendência de baixa nos juros é positiva para o mercado: "A expectativa é de um 2024 mais estabilizado para a locação de imóveis residenciais, com a sinalização de corte nos juros, que pode equilibrar a demanda com a oferta. Com a vida entrando nos eixos, é esperado que a situação melhore para os inquilinos", disse.